quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Criança portadora de necessidades especiais: contrapontos entre a legislação e a realidade (I)




Viviane Marten Milbrath
Hedi Crecencia Heckler de Siqueira
Simone Coelho Amestoy
Maria Elizabeth Cestari




Trata-se de uma reflexão teórico-filosófica que busca confrontar a legislação brasileira a respeito da criança portadora de necessidades especiais com a prática cotidiana. Embora os direitos da criança tenham sido legalizados em 1990 pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, observa-se, cotidianamente, uma lacuna entre o que é garantido por lei e o que é concretizado na prática. Para romper com a trajetória histórica de preconceitos a que essas crianças são expostas, há necessidade de colocar tal legislação em prática. Entretanto, para alcançar essa praticidade é imprescindível que as famílias das crianças portadoras de necessidades especiais sejam sabedoras de seus direitos, exercendo a sua cidadania, a fim de usufruir de uma melhor qualidade de vida. A realidade, conforme literatura, poderá ser modificada através do exercício da cidadania da criança e de sua família, gerando a conscientização de que são sujeitos detentores de direitos.
Descritores: Crianças portadoras de deficiência. Políticas públicas. Defesa da criança e do adolescente. Defesa das pessoas com deficiência.




INTRODUÇÃO
A história da criança no Brasil e no mundo passou por inúmeras fases, relacionadas com os
acontecimentos e valores de cada época. Assim,  desde a pré-história até a atualidade, vem ocorrendo mudanças na forma como a sociedade percebe e cuida da criança. Existem registros na literatura que comprovam um processo histórico de exclusão para com as crianças e os adolescentes, principalmente, os portadores de necessidade especiais, demonstrando que esses foram alijados de seus direitos fundamentais, sendo tratados como objetos, e não como sujeitos de direitos(1). Na antiga Grécia, segundo historiadores, as crianças que nasciam fora do padrão considerado “normal” pela sociedade da época, eram motivo de extrema vergonha, visto que era considerado uma fraqueza familiar(2). O modo como a sociedade tem visto e convivido com as pessoas portadoras de necessidades especiais tem acompanhado as mudanças dos valores, conceitos religiosos, morais, econômicos da época e conforme a sociedade em que se situa(3).
No Brasil, todas as crianças passaram a ter seus direitos legalizados somente em 13 de julho de 1990, ao ser sancionada a Lei no 8.069, que rege o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual dispõe sobre a sua proteção integral(4). Por tanto, a nova constituição Federal de 1988, juntamente com o ECA, passou a reconhecer a cidadania da população infanto-juvenil, indiferentemente do sexo, cor, etnia, classe social, desenvolvimento físico ou cognitivo. Assim, toda a criança passou a ser cidadã. Embora os direitos da criança tenham sido legalizados a partir dessa data, observa-se, cotidianamente, uma lacuna entre o que é garantido por lei e o que é praticado na e pela sociedade.
O cuidado à criança, sobretudo à criança portadora de necessidades especiais, muitas vezes fica reduzido à atenção biomédica/biologicista, ou seja, voltada ainda, predominantemente, para o atendimento das necessidades biológicas, apesar da existência de uma orientação para que seja prestado um cuidado integral à criança/família(5), contemplando seus aspectos biopsicosociais e espirituais. Por conseguinte, têm-se uma desvalorização da criança como um ser multidimensional e singular, que lhe dá um significado particular.
Com essa perspectiva sobre a saúde, a criança portadora de necessidades especiais, passa, geralmente, a não se enquadrar como sujeito passível de ação por não poder ser “curada”(5). Essas questões inquietam a “onipotência” do profissional da saúde, fragilizado frente a sua incapacidade de não poder “curar” a criança, pois esse se encontra impregnado por uma “norma”, que vê a cura como o produto de seu processo de trabalho. Para que a assistência à criança extrapole a busca pela ausência de doenças, é preciso entender que a saúde encontra-se interligada com a ascensão de uma maior qualidade de vida ao ser humano, com a finalidade de alcançar o bem-estar biopsicosocial e espiritual.
Olhar a criança nesta perspectiva é fundamental para compreendê-la em sua integralidade, não focando apenas as características que lhe conferem limitações. Entretanto, é importante conhecer/compreender as limitações impostas pelas suas necessidades especiais, mas é imprescindível percebê-la como uma criança que carece de amor, atenção, respeito, dignidade. Este estudo tem como objetivo realizar uma reflexão que busca confrontar a legislação brasileira a respeito da criança portadora de necessidades especiais com a realidade encontrada na prática cotidiana.


A legislação brasileira versus a realidade


 O primeiro ponto a ser discutido refere-se ao artigo 5º do ECA, que proíbe qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão para com qualquer criança, indiferentemente do sexo, idade, religião, classe social, estado físico(4). Apesar dessas proibições, muitas são as limitações impostas pela sociedade para com as crianças portadoras de necessidades especiais. Encontram-se, na prática, situações excludentes que se tornam parte da rotina diária, acarretando, não raro, um conformismo frente à indiferença de uma sociedade, extremamente preconceituosa, para com aqueles que fogem do padrão estipulado por ela como “ideal”(6,7).
O artigo 7o do ECA afirma que a criança tem direito à proteção, à vida e à saúde em seu conceito ampliado mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o seu nascimento, crescimento e desenvolvimento em condições dignas de existência(4). No entanto, na prática, conti-
nua-se a constatar um déficit no cuidado prestado pelos profissionais de saúde que, muitas vezes, não capacitam as famílias para prestar os cuidados a essa criança especial(8). Estudos revelam a existência de uma lacuna no que concerne a anunciação do diagnóstico das necessidades especiais à família. Esse fato acarreta uma dificuldade naformação do vínculo entre o trinômio mãe-pai-filho, e, por conseguinte, no cuidado prestado à criança(9-11).




(Continua)

2 comentários:

  1. Olá! Boa tarde!

    Após pesquisa na internet, gostaria de compartilhar com vocês, o link de sugestão de um projeto de lei criado por mim (Pai de Filho Autista), para tentar melhorar a qualidade de vida de crianças portadoras de necessidades especiais.

    Acesse o link abaixo para maiores detalhes e informações:

    https://www.change.org/p/congresso-nacional-isen%C3%A7%C3%A3o-integral-de-imposto-de-renda-retido-na-fonte-para-pais-de-crian%C3%A7as-especiais?recruiter=379704520&utm_source=share_for_starters&utm_medium=copyLink

    Neste momento, além da sugestão criada na página do Senado Federal, criei o abaixo assinado eletrônico que poderá ser direcionado ao Senado Federal. Entretanto, preciso de apoio de uma ONG para ajudar na criação dessa lei tão importante.

    Aguarado o contato de vocês!

    Alex Carvalho
    (79)99112-5010
    (79)3212-8525

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    1. Olá, João!

      Agradecemos o contato.

      Sua iniciativa é de extrema importância.

      Conte com o nosso apoio.

      ONG Sorriso Novo
      3867-9331 / 3105-9331

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