terça-feira, 7 de abril de 2015

Atenção ao autismo

Transtorno do espectro autista. Talvez você nunca tenha ouvido falar, mas certamente conhece alguém que se encaixa nesta condição, pois em nosso círculo de amizades e contatos sempre existe um autista. O problema é que, provavelmente, você nem a própria pessoa ou a família sabem que ela está dentro deste espectro. Mais de 80% dos autistas brasileiros não têm diagnóstico. A sociedade sequer imagina que o transtorno seja tão prevalente.
No ano passado, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos avaliou mais de 360 mil crianças de 8 anos de idade. De acordo com a pesquisa, um em cada 68 desses menores é autista. Significa que 1,5% das crianças americanas, nessa faixa etária, tem o transtorno. Já na Coreia do Sul, a prevalência é ainda maior, pois estudo de 2013 mostrou que 2,6% de todos menores entre 7 e 12 anos têm autismo. Multiplicam-se pelo mundo exemplos em que o Estado assumiu a responsabilidade pelo enfrentamento deste grande problema de saúde pública.
No Brasil, apesar de não existirem estudos epidemiológicos abrangentes, estima-se que 1% de toda a população esteja no espectro autista. Ou seja, temos aproximadamente dois milhões de autistas em nosso país. Para termos uma ideia do quão impactante é o número de crianças com autismo, basta juntarmos os casos de diabetes infantil, HIV na infância e todos os tipos de câncer que atingem a população pediátrica. Ainda assim, existem mais crianças dentro do espectro autista do que em todas essas condições em conjunto.
O autismo é um grave problema de saúde pública. Não existem programas de diagnóstico precoce — ou até mesmo tardio — do transtorno, faltam centros especializados, há carência de profissionais devidamente capacitados para o tratamento específico, bem como um sistema público de financiamento para fazer frente aos altíssimos custos relacionados ao tratamento e à educação de autistas.
Se formos mergulhar no dia a dia dessas famílias, independentemente de classe social, vamos nos deparar com uma realidade que leva pais e mães ao adoecimento, aos quadros de depressão que requerem tratamento medicamentoso e psicológico. O transtorno não acomete apenas os milhões de autistas, mas sim todos os seus núcleos familiares, afetando, diretamente, a vida de dez milhões de pessoas. Ainda assim, o SUS e os governos permanecem negligentes, condenando milhões de brasileiros a uma vida de grandes dificuldades.
O SUS mantém embaixo do tapete esses números alarmantes porque enfrentar o problema requer dinheiro, planejamento e vontade política. Também não podemos eximir de responsabilidade as universidades, que deveriam capitanear estudos populacionais multicêntricos e demonstrar, através de metodologia científica adequada, o real tamanho do problema, para tirar da negligência do SUS os milhões de autistas brasileiros que precisam de tratamento, de apoio, de inclusão escolar e de estratégias para inserção no mercado de trabalho.


José C. Pitangueira Filho é especialista em gestão de saúde e diretor executivo do Instituto Priorit

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