Características do autismo:
Existem muitos graus de autismo, mas quanto mais cedo a criança for
identificada e começar o treinamento de habilidades sociais, melhor será
seu desenvolvimento.
Segundo
a ASA (Autism Society of America), indivíduos com autismo usualmente
exibem pelo menos metade das características listadas a seguir:
- Dificuldade de relacionamento com outras pessoas
- Riso inapropriado
- Pouco ou nenhum contato visual - não olha nos olhos
- Aparente insensibilidade à dor - não responde adequadamente a uma situação de dor
- Preferência pela solidão; modos arredios - busca o isolamento e não procura outras crianças
- Rotação de objetos - brinca de forma inadequada ou bizarra com os mais variados objetos
- Inapropriada fixação em objetos
- Perceptível hiperatividade ou extrema inatividade - muitos têm problemas de sono ou excesso de passividade
- Ausência de resposta aos métodos normais de ensino - muitos precisam de material adaptado
- Insistência em repetição desnecessária de assuntos, resistência à mudança de rotina
- Não tem real medo do perigo (consciência de situações que envolvam perigo)
- Procedimento com poses bizarras (fixar objeto ficando de
cócoras; colocar-se de pé numa perna só; impedir a passagem por uma
porta, somente liberando-a após tocar de uma determinada maneira os
alisares)
- Ecolalia (repete palavras ou frases em lugar da linguagem normal)
- Recusa colo ou afagos - bebês preferem ficar no chão que no colo
- Age como se estivesse surdo - não responde pelo nome
- Dificuldade em expressar necessidades - sem ou limitada linguagem oral e/ou corporal (gestos)
- Acessos de raiva - demonstra extrema aflição sem razão aparente
- Irregular habilidade motora - pode não querer chutar uma bola, mas pode arrumar blocos
- Desorganização sensorial - hipo ou hipersensibilidade, por exemplo, auditiva
- Não faz referência social - entra num lugar desconhecido sem antes olhar para o adulto (pai/mãe) para fazer referência antes e saber se é seguro
Observação: É relevante salientar que nem todos os indivíduos
com autismo apresentam todos estes sintomas, porém muitos dos sintomas
estão presentes entre os 12 e os 24 meses da criança. Eles variam de
leve a grave e em intensidade de sintoma para sintoma, pois o autismo se
manifesta de forma única em cada pessoa. Adicionalmente, as alterações
dos sintomas ocorrem em diferentes situações e são inapropriadas para
sua idade.
Vale salientar também que a ocorrência desses sintomas não é
determinista no diagnóstico do autismo. Para tal, se faz necessário
acompanhamento com psicólogo, psiquiatra da infância ou neuropediatra.
Diagnóstico
Os sistemas diagnósticos (DSM-IV e CID-10) têm baseado seus critérios
em problemas apresentados em três áreas, com início antes dos três anos
de idade, que são:
a) comprometimento na
interação social;
b) comprometimento na
comunicação verbal e não-verbal, e no brinquedo imaginativo;
c)
comportamento e interesses restritos e repetitivos de maneira desnecessária.
É relevante salientar que essas informações devem ser utilizadas
apenas como referência. Além de destacar a importância do diagnóstico
precoce "porque quanto mais cedo é identificado um transtorno, mais
rápido o curso normal do desenvolvimento pode ser retomado. Porém os
resultados dependem não somente da identificação dos atrasos e da
indicação dos tratamentos adequados e eficazes, mas da aceitação dessa
condição diferenciada pelas famílias e pelo futuro de cada um, que não
dominamos nem sabemos", como explica o psiquiatra da infância e
adolescência Walter Camargos Jr.
Recomenda-se caracterizar a queixa da família: sinais, sintomas,
comportamento, nível de desenvolvimento cognitivo e escolar do indivíduo
- quando for o caso, relacionamento inter-pessoal, investigar os
antecedentes gineco-obstétricos, história médica pregressa, história
familiar de doenças neurológicas, psiquiátricas ou genéticas, analisar
os critérios do DSM-IV-TR ou da CID-10, realizar avaliações
complementares (investigações bioquímicas, genéticas, neurológicas,
psicológicas, pedagógicas, fonoaudiológicas, fisioterápicas), pensar a
respeito do diagnóstico diferencial, investigar a presença de
comorbidades, classificar o transtorno, planejar e efetivar o
tratamento.
Muitas vezes, o autismo é confundido com outras síndromes ou com
outros transtornos globais do desenvolvimento, pelo fato de não ser
diagnosticado através de exames laboratoriais ou de imagem, por não
haver marcador biológico que o caracterize, nem necessariamente aspectos
sindrômicos morfológicos específicos; seu processo de reconhecimento é
dificultado, o que posterga a sua identificação.
Um diagnóstico preciso deve ser realizado, por um profissional
qualificado, baseado no comportamento, anamnese e observação clínica do
indivíduo.
O autismo pode ocorrer isoladamente, ser secundário ou apresentar
condições associadas, razão pela qual é extremamente importante a
identificação de comorbidades bioquímicas, genéticas, neurológicas,
psiquiátricas, entre outras.
Condições que podem estar associadas ao Autismo: Acessos de
raiva, agitação, agressividade, auto-agressão, auto-lesão (bater a
cabeça, morder os dedos, as mãos ou os pulsos), ausência de medo em
resposta a perigos reais, catatonia, complicações pré, peri e
pós-natais, comportamentos autodestrutivos, déficits de atenção,
déficits auditivos, déficits na percepção e controle motor, déficits
visuais, epilepsia , esquizofrenia, hidrocefalia, hiperatividade,
impulsividade, irritabilidade, macrocefalia, microcefalia, mutismo
seletivo, paralisia cerebral, respostas alteradas a estímulos sensoriais
(alto limiar doloroso, hipersensibilidade aos sons ou ao toque, reações
exageradas à luz ou a odores, fascinação com certos estímulos), retardo
mental, temor excessivo em resposta a objetos inofensivos, transtornos
de alimentação (limitação a comer poucos alimentos), transtornos de
ansiedade, transtornos de linguagem, transtorno de movimento
estereotipado, transtornos de tique, transtornos do humor/afetivos
(risadinhas ou choro imotivados, uma aparente ausência de reação
emocional), transtornos do sono (despertares noturnos com balanço do
corpo).
Síndromes Cromossômicas ou Genéticas: Acidose láctica,
Albinismo oculocutâneo, Amaurose de Leber, Desordem marfan-like,
Distrofia muscular de Duchenne, Esclerose Tuberosa, Fenilcetonúria,
Galactosemia ,Hipomelanose de Ito, Histidinemia, Neurofibromatose tipo
I, Seqüência de Moebius, Síndrome de Angelman ,Síndrome de Bourneville ,
Síndrome da Cornélia de Lange ,Síndrome de Down, Síndrome fetal
alcóolica, Síndrome de Goldenhar, Síndrome de Hurler, Síndrome de
Joubert, Síndrome de Laurence-Moon-Biedl, Síndrome de Landau-Kleffner,
Síndrome de Noonan, Síndrome de Prader-Willi, Síndrome da Talidomida, Síndrome de Tourette, Síndrome de Sotos, Síndrome do X-frágil,Síndrome de Williams
Infecções associadas ao Autismo: Caxumba,Citomegalovírus,Herpes,Pneumonia,Rubéola, Sarampo, Sífilis,Toxoplasmose e Varicela
O diagnóstico do transtorno autista é clínico e não poderá, portanto,
ser feito puramente com base em testes e ou escalas de avaliação.
Avaliações de ordem psicológica, fonoaudiológica e pedagógica são importantes para uma avaliação global do indivíduo.
Recomenda-se utilizar um instrumento de avaliação adicional para
identificar a presença de Retardo Mental (RM). Na maioria dos casos de
autismo (70% a 85%), existe um diagnóstico associado de RM que pode
variar de leve a profundo.
A incidência de epilepsia nos indivíduos com autismo varia de 11% a 42%.
Convulsões podem desenvolver-se, particularmente, na adolescência.
Exames
O diagnóstico do autismo é feito clinicamente, mas pode ser
necessário a realização de exames auditivos com a finalidade de um
diagnóstico diferencial.
Outros exames devem ser considerados não para diagnóstico, mas com a
finalidade de se realizar um bom tratamento. São eles: ácidos orgânicos,
alergias alimentares, metais no cabelo, perfil ION, imunodeficiências,
entre outros.
Relato
O médico José Salomão Schwartzman, referência no Brasil em Neurologia da Infância e Adolescência, relata um caso interessante de autismo:
"Na década de 1970, recebi um paciente, R., com cinco anos de
idade, encaminhado por uma amiga psicóloga. Era uma criança estranha,
que tinha sido considerada, até pouco tempo antes, como portadora de
deficiência mental. Muito embora tivesse apresentado desenvolvimento
motor normal, a sua fala e seu comportamento se mostravam muito
alterados.
Sua mãe relatava que ele havia ficado totalmente mudo até os 3, 4
anos de idade, quando, de um dia para outro, havia começado a ler
manchetes dos jornais.
Embora pudesse falar a partir de então,
somente o fazia quando queria e quase nunca com a finalidade de se
comunicar com os outros. Era isolado e parecia bastar-se, ignorando as
pessoas que viviam à sua volta. Por outro lado, era muito inquieto e
agitado, estando continuamente em movimento. Uma das poucas atividades que o deixavam mais tranquilo era ficar parado em uma das esquinas mais movimentadas de São Paulo
observando os ônibus que passavam. Após uma hora de observação,
demonstrava estar satisfeito. Chegando em casa, desenhava todos os
ônibus que havia observado, com as cores e as placas corretas.
Reencontrei R. recentemente. É um adulto estranho; não gosta de fixar
o olhar no interlocutor; fala de um modo bastante formal. Ao entrar no
meu consultório, após todos esses anos, perguntou-me sobre o meu
primeiro consultório e demonstrou lembrar-se de inúmeros detalhes de
consultas ocorridas há cerca de 30 anos. Contou-me que, quando criança,
haviam dito que ele era autista, imagine! Estava muito bem e ganhava o
seu dinheiro fazendo ilustrações para cadernos pedagógicos de algumas
escolas.
Na ocasião, o caso me pareceu singular na medida em que aquela
criança, tida como deficiente mental, era seguramente diferente em
vários aspectos de outras crianças com deficiência mental.
A
equipe que atendia R. achou que a melhor hipótese diagnóstica era a de
Autismo, condição muito pouco conhecida e de diagnóstico muito difícil
àquela época. O quadro, assim diagnosticado, passou a ser da alçada de
psiquiatras e psicólogos. Para mim, então, tratava-se de uma patologia
que não envolvia problemas relacionados a funções do sistema nervoso. Os
tempos mudaram, e hoje sabemos que o Autismo é uma condição de bases
biológicas e bem mais freqüente do que se acreditava. Há, na verdade,
quem cite números muito maiores, o que decorre não somente de um maior
conhecimento a respeito do assunto e, portanto, de uma identificação
mais freqüente, mas também de um conceito que tem se expandido nos
últimos anos, permitindo que quadros que anteriormente não receberiam
este diagnóstico possam ser assim rotulados."
(continua)