sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Quando as terminologias importam

Devo usar “PcD” ou “Crianças Especiais” para me referir à pessoa com deficiência?

Denis Deli para o jornalcruzeiro.com.br


A deficiência não deve ser atrelada à pessoa, pois é uma responsabilidade do “meio” ser acessível para todos os cidadãos. Crédito da foto: Divulgação

Você sabe qual a maneira correta de se referir à pessoa com deficiência? Aliás, se existe uma maneira correta, quer dizer que existem outras que são erradas. Sim, erradas! Podemos até arrumar desculpas e justificativas para a utilização de termos inadequados, mas eles continuarão sendo errados!

Muitos segmentos sociais vivem um momento de “afirmação”. Ou seja: de luta pela garantia plena dos seus direitos. Cabe a nós, como sociedade, respeitar e reconhecer essa luta. Isso é inclusão.
Você precisa saber que todo segmento em fase de afirmação tem um ingrediente importante: “militância”. Nunca devemos subestimar o poder, nem a importância, que isso tem.

No movimento LGBTQIA+, por exemplo, o correto é utilizar a expressão “relacionamento homossexual” ou “relacionamento homoafetivo”? No movimento de igualdade racial, o correto é utilizar “pessoa negra” ou “preta”?

Essas questões podem parecer apenas detalhes, mas são fundamentais na defesa de seus segmentos, pois representam o “reconhecimento da sua luta”.

Em 2006, a Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, proclamada pela Organização das Nações Unidas (ONU), determinou que o termo correto é “pessoa com deficiência”.

Isso quer dizer, que você NÃO pode usar termos como: portadores de deficiência, portadores de necessidades especiais ou deficiente.

A terminologia representa uma mudança de conceito: valoriza a pessoa, que passa a vir em primeiro plano na frase. Outro ponto importante é que a “deficiência” deixa de ser um “atributo” da pessoa e passa a ser atribuída ao “meio”. Ou seja: é uma pessoa cujo meio deve ser acessível.

Quando você utiliza o termo “deficiente”, você está atribuindo a “responsabilidade” da deficiência à pessoa. Se existissem apenas rampas, ao invés de escadas, qualquer pessoa em cadeira de rodas, por exemplo, poderia ter acesso a qualquer lugar. Ou seja: é a pessoa ou o meio que precisa mudar? Se todos nós fôssemos fluentes em Libras — língua brasileira de sinais –, a comunicação não seria um problema para a pessoa surda. E por aí vai.

Agora pense no termo “portador de deficiência”. Ele também atribui à pessoa a “responsabilidade” pelas barreiras de comunicação ou acessibilidade, usando a questão da deficiência para justificar a falta de acessibilidade no “meio”. Além do mais, você só “porta” algo que, em algum momento, pode “deixar de portar”. Isso não acontece com a questão da deficiência.

Mas o pior exemplo ainda está por vir. CUIDADO! Nunca utilize o termo “necessidades especiais” ou “pessoas especiais”. Isso pode parecer simpático, mas é totalmente preconceituoso. Quem nunca se deparou com a expressão “crianças especiais” para se referir a uma criança com deficiência?

É comum que as pessoas utilizem o termo “especial” com a finalidade de “suavizar” a questão da deficiência. Mas isso não deve ser feito.

Como já vimos, a deficiência não deve ser atrelada à pessoa, pois é uma responsabilidade do “meio” ser acessível para todos. Quanto mais suavizarmos, ou escondermos, a deficiência, menos pressionaremos o “meio” a se tornar acessível.

Não tenha medo. Utilize o termo “deficiência” na frase. Você não vai agredir nem menosprezar ninguém. Pelo contrário: demonstrará que você respeita e reconhece sua luta!

Preste atenção nestas frases: aluno com deficiência, filho com deficiência, vizinho com deficiência, amigo com deficiência etc. Estes são exemplos corretos! Utilize.

Mas e o termo “PcD”, você pode utilizar? A resposta é: depende. Ele só deve ser utilizado quando for uma abreviação, literal, de “pessoa com deficiência”.

O uso inadequado da abreviação “PcD” cria um rótulo, que deve ser evitado. A deficiência não define uma pessoa, por isso não também não deve caracterizá-la.

É comum ver frases como: “fulano tem um filho PcD”, “a escola não está adaptada para receber os alunos PcD”; “a venda de carros PcD garante isenção de impostos para quem precisa” etc.

Todos estes exemplos estão errados. Faça um exercício: monte a frase sem a abreviação, se ela fizer sentido, você estará utilizando o termo PcD da maneira correta.

Exemplo: “fulano tem um filho PcD”. Você usaria: “fulano tem um filho pessoa com deficiência”? Não. Então não deve ser usado de forma abreviada.

A frase correta é: “fulano tem um filho com deficiência”. Não podemos deixar que nossa “preguiça” seja maior que a luta de um setor inteiro.

Se possível, evite o termo PcD. Como ele é frequentemente utilizado da maneira errada, muitas pessoas com deficiência já não gostam mais dessa terminologia. Porém, se for utilizá-lo, faça da maneira correta.

Cuidado com as palavras. Elas são importantes!

*Denis Deli é jornalista e palestrante, especializado na inclusão da pessoa com deficiência.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Escolas podem negar matrículas de alunos autistas devido ao não uso de máscara? Veja o que diz a lei

Advogado explica relação com a Lei que dispensa a obrigatoriedade do acessório de proteção para pessoas com deficiência

diariodonordeste.verdesmares.com.br


Uma das consequências quanto à resistência de matrículas de alunos autistas pelo não uso de máscara é o acionamento do Ministério Público "para defender os interesses da criança", segundo advogado Alexandre Costa Foto: Camila Lima

Com várias questões envolvendo sensibilidade, pessoas dentro do espectro autista não conseguem permanecer com ou até mesmo usar máscaras de proteção contra a Covid-19, como é de obrigação para o restante da população em geral durante este momento de pandemia. Nesse sentido, as escolas podem recusar matrículas de alunos autistas devido ao não uso da máscara?  

De acordo com o advogado Alexandre Costa, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Doenças Raras da OAB-CE, as escolas não podem fazer a recusa baseado na Lei Federal Nº 14.019, de 2 de Julho de 2020.

“A única exigência é uma declaração médica informando sobre a situação do estudante. No geral, é muito importante que todos os colaboradores da rede de ensino saibam da dispensa do uso de máscaras para pessoas com deficiência no intuito de evitar o constrangimento, a discriminação e as abordagens desagradáveis”, alerta o advogado.

Direito de permanecer sem máscara

Mesmo assim, caso a escola ainda resista em matricular o aluno com deficiência, o advogado orienta para que os pais ou responsáveis procurem os seus direitos. “A criança tem o direito de permanecer sem máscara. Isso é lei. A escola não tem o direito de fazer valer a sua própria vontade em decorrência de quaisquer motivos”. 

Como resposta à resistência, a instituição pode receber uma penalização, considera Alexandre. “O Ministério Público pode ser acionado para defender os interesses da criança. Há também o claro constrangimento e discriminação que são passíveis de punição. Cabe à escola capacitar toda a equipe escolar sobre o direito das crianças autistas. Elas devem ser inseridas no contexto educacional de forma com que elas aprendam em um ambiente saudável”, detalha.

Lei é tentativa de compensar limitações

“É comum as escolas descumprirem a lei, tanto a da dispensa do uso de máscaras para crianças dentro do espectro quanto a lei estadual que trata sobre o assento prioritário em sala de aula para crianças com TDH. As crianças sempre saem prejudicadas. O que a lei tenta fazer é uma compensação porque essas crianças têm limitações que as diferenciam das demais. E, no momento que tentam igualar os desiguais, há uma inferiorização enorme”, retrata o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Doenças Raras, Alexandre Costa.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Covid-19 é dez vezes mais letal em pessoas com síndrome de Down, indica estudo

Pesquisadores sugerem que indivíduos com essa condição genética devem ser prioridade para a vacinação

Por Carolina Fioratti para o super.abril.com.br

Idosos, diabéticos e pessoas com doenças respiratórias ou cardiovasculares são tidos como grupos de risco da Covid-19 desde o começo na pandemia. Mas também há outros fatores que podem ser agravantes da doença e ainda estão sendo estudados. A síndrome de Down (SD), que aumenta a suscetibilidade da pessoa à pneumonia, entra nessa lista.

Pesquisadores da Universidade de Oxford, em parceria com outras instituições britânicas, analisaram dados de 8,26 milhões de adultos do Reino Unido. Dentro desse conjunto, havia informações sobre 4053 indivíduos com síndrome de Down. Os cientistas compararam os casos de coronavírus entre as pessoas que tinham a síndrome e aquelas que não tinham, e concluíram que a SD aumenta em dez vezes o risco de morrer por consequência da Covid-19 (e multiplica por cinco os casos de hospitalização relacionados a essa doença). O estudo foi publicado em outubro na revista científica Annals of Internal Medicine.

De acordo com pesquisadores, a própria genética de pessoas com síndrome de Down acaba tornando-as mais suscetíveis ao Sars-CoV-2. Os indivíduos com SD possuem três cópias do cromossomo 21, uma a mais do que o normal. Dentro do cromossomo 21, existe um gene chamado TMPRSS2, e aí é que está o problema: para invadir as células, o coronavírus se conecta a uma enzima que é codificada justamente por esse gene. As pessoas com síndrome de Down produzem maior quantidade dessa enzima, o que acaba facilitando a ação do vírus.

Esta hipótese foi analisada em junho por pesquisadores do Centro de Regulação Genômica de Barcelona, ​​na Espanha. O estudo, que não passou por revisão por pares, indica que as células de pessoas com síndrome de Down expressam 1,6x mais TMPRSS2 do que as de pessoas sem a alteração genética.

Além disso, o próprio sistema imunológico das pessoas com síndrome de Down pode ser visto como algo negativo durante uma infecção pelo novo coronavírus. O organismo dessas pessoas não desenvolve as células T de forma adequada e os níveis de células B circulantes são baixos. Além disso, o corpo produz interferon – uma primeira linha de defesa contra os vírus – de forma intensa. Em um primeiro momento, a resposta do interferon pode ser positiva contra a Covid-19, mas sua atividade elevada pode causar uma desregulação do sistema imune, desencadeando a chamada tempestade de citocinas, que pode tornar o quatro fatal em cerca de uma semana.

Em um estudo publicado no jornal acadêmico Cell Reports, pesquisadores mostraram que o medicamento baricitinibe foi capaz de bloquear essa alta onda de interferon em camundongos com trissomia do 21. A Food and Drug Administration, agência reguladora dos EUA, liberou o remédio, em combinação com o remdesivir, para uso emergencial em pacientes com Covid-19. Mas vale ressaltar que não houve testes em larga escala em humanos ou qualquer comprovação de que o medicamento funciona para além dos ratos.

Diante dessas pesquisas, a Trisomy 21 Research Society International, uma organização científica que estuda a condição genética, tem solicitado que pessoas com SD, principalmente as maiores de 40 anos, tenham preferência para a vacinação. No dia 2 de dezembro, o Comitê Conjunto de Vacinação e Imunização do Reino Unido também recomendou que esse grupo fosse priorizado. No entanto, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) ainda não adicionou a SD na lista de condições que aumentam os riscos de Covid-19. De acordo com o CDC, ainda não há evidências suficientes para tal.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Cientistas investem em novas abordagens para enfrentar o autismo

Cientistas investem em abordagens capazes de amenizar os sintomas do transtorno e proporcionar qualidade de vida a pacientes e familiares. Estudos para a descoberta precoce do distúrbio e para mudanças na flora intestinal estão entre as apostas


Vilhena Soares para o correiobraziliense.com.br


autismo não tem cura, mas é tratado por meio do acompanhamento de diversos especialistas, como psicoterapeutas e fonoaudiólogos, em um processo que costuma ser árduo para o paciente e familiares. Na tentativa de auxiliá-los, pesquisadores têm buscado alternativas que ajudem a diminuir, com mais eficiência, os sintomas desse distúrbio. Estudos que focam no diagnóstico precoce e em alterações na microbiota intestinal são algumas das apostas recentes.

Nos últimos anos, muitos cientistas têm voltado os olhos para ligações entre a microbiota humana e enfermidades – entre elas, o transtorno do espectro autista (TEA). Alguns estudos recentes revelam ligações intrigantes entre a composição da microbiota intestinal e o TEA. “Essas pesquisas mostram uma composição anormal de bactérias em pessoas com esse transtorno e também em cobaias que sofreram modificações para apresentá-lo”, afirma Rosa Krajmalnik-Brown, pesquisadora da Universidade do Arizona e especialista no tema.


Pesquisadora da Universidade do Arizona, Rosa Krajmalnik-Brown é especialista no uso de intervenções com bactérias (foto: Universidade do Arizona/Divulgação)

Com base nessas descobertas, Krajmalnik-Brown e sua equipe resolveram testar o efeito de intervenções na microbiota intestinal de autistas. Eles realizaram a transferência de micróbios saudáveis para o intestino de 18 pessoas com TEA por um período de sete a oito semanas. Após o tratamento, observaram redução de 80% nos problemas gastrointestinais dos participantes, além de uma diminuição considerável em outros sintomas do transtorno.

Os cientistas detectaram também aumento da diversidade microbiana, algo considerado benéfico, principalmente de dois gêneros: Bifidobacteria e Prevotella. “No sistema digestório, estão presentes vastas colônias de bactérias que desempenham funções que vão desde a digestão dos alimentos e o controle do peso corporal até os efeitos no cérebro e no comportamento. Por isso, mudanças nessa população podem, sim, gerar efeitos terapêuticos”, explica a autora do trabalho, apresentado no American Association for the Advancement of Science (AAAS) Meeting 2021.

Carlos Guilherme Figueiredo, psiquiatra e vice-presidente da Associação Psiquiátrica de Brasília, explica que o estudo mostra dados que condizem com o que já se sabe sobre a ligação entre o autismo e problemas gastrointestinais. “Alterações no estômago são comuns em pessoas que apresentam esse transtorno, como refluxo, constipação e desconforto abdominal, e estão relacionadas com a piora de outros sintomas, como a impaciência e a ansiedade, gerando um desconforto ainda maior”, detalha. “Ter observado melhoras com esse tipo de intervenção é algo muito animador, até porque é uma intervenção fácil de ser feita. Caso se confirme como uma opção eficaz, o transplante de microbiota poderia ser uma alternativa adotada para tratar muitos pacientes”, aposta.

Atlas neural

Outra aposta dos cientistas para tratar o autismo com mais eficácia é o diagnóstico precoce. Essa missão foi assumida por pesquisadores da Universidade do Texas que apostam na possibilidade de identificar o TEA já nos seis primeiros meses de vida. No estudo, a equipe recrutou 75 crianças, que foram submetidas a um monitoramento neural minucioso para a identificação de possíveis marcadores do transtorno. “O objetivo desse projeto é identificar o autismo o mais cedo possível e tratar os sintomas antes que eles progridam”, enfatiza, em comunicado, Leslie Neely, professor-assistente de psicologia educacional na instituição americana.


Confira diferentes áreas de pesquisa que têm o objetivo de melhorar o enfrentamento ao transtorno do espectro do autismo (TEA) (foto: Arte/Valdo Virgo)

Os cientistas seguem conduzindo as análises, mas adiantam que já obtiveram resultados iniciais que ajudarão no desenvolvimento de uma espécie de atlas neural do distúrbio. “Avaliações iniciais já nos mostraram que é possível chegar ao nosso objetivo final. Acreditamos que também poderemos usar esses dados para apontar qual o melhor tipo de terapia a ser usada e até retardar o aparecimento dos sintomas”, diz Neely.

Para o psiquiatra Cargos Figueiredo, todas as ferramentas desenvolvidas com o intuito de auxiliar e adiantar a identificação do TEA são bem-vindas, pois podem contribuir severamente para o tratamento do distúrbio. “Quando conseguimos observar o problema cedo, melhoramos consideravelmente o prognóstico do paciente e evitamos comorbidades, ou seja, outras doenças que surgem ao mesmo tempo. Ainda está cedo, mas esses estudos nos trazem a esperança de intervenções precoces mais efetivas.”

Apesar dos dados positivos, o médico destaca que é necessário ser prudente, já que novas alternativas de diagnóstico e de tratamento precoce ainda estão em testes iniciais. “É importante deixar claro que são opções que poderão ser usadas apenas mais pra frente, caso se confirmem como eficazes. Vemos, muitas vezes, famílias que se desesperam em busca de tratamentos e se decepcionam. São trabalhos animadores, mas que ainda precisam ser estudados antes de ser postos em prática.”

João Armando, psiquiatra do Instituto Castro e Santos (ICS), em Brasília, também destaca que os esforços científicos para entender e lidar melhor com o autismo são importantes e merecem destaque. Mas, no momento, enfatiza ele, não há opção que esteja próxima de reverter a síndrome como um todo. “É importante destacar que ainda não temos grande conhecimento nem sequer de todos os fatores da etiologia do autismo. Por isso, é sempre necessário cautela quando falamos de novos tratamentos. Penso que ainda não estamos perto da cura ou do controle completo da doença”, reforça.

Raízes complexas

O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio neurobiológico complexo, cujas raízes ainda são desconhecidas. Pesquisas mostram uma possível predisposição genética relacionada a ele, além de infecções durante a gravidez e fatores ambientais, como a poluição. O diagnóstico é feito no início da infância, por meio da desconfiança dos pais, que podem notar problemas de atenção dos filhos. A partir daí, são feitos testes para ter a confirmação com a ajuda de especialistas, como pediatras.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

7 livros para crianças aprenderem a respeitarem pessoas com deficiência

Separamos obras para ensinar aos pequenos sobre representatividade e respeito ao próximo

Por Alice Arnoldi para o bebe.abril.com.br

Juliana Pereira/Bebê.com.br

No Brasil, 21 de setembro é conhecido como Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência desde 2005. O objetivo da data é manter acesa a discussão sobre a importância de criar recursos de inclusão na sociedade. Neste ano, esse debate aconteceu em um evento virtual transmitido pelo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, com o lançamento da campanha “Eu Respeito”, idealizada pela Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Junto com a elaboração de políticas públicas para que a inclusão saia do papel e aconteça na prática, cada família também tem a sua missão de repensar os diálogos inclusivos com os filhos, especialmente para que eles não repercutam expressões ou frases preconceituosas. E para aqueles que são deficientes, é essencial que se tenha em mãos materiais de representatividade, reforçando que não há nada de errado com quem eles são.

Pensando nisso, selecionamos sete livros em que os personagens principais são deficientes. Entre eles, dois ganham um toque ainda mais especial por serem baseados em fatos reais.

1. O menino que via com as mãos – Alexandre Azevedo

Enquanto os amigos exploram o mundo apenas observando-o, a experiência do menino Juquinha é mais profunda. Ele caminha pelos diferentes lugares do mundo tateando as suas superfícies para reconhecê-las. E o motivo disso é que ele é deficiente visual.

O livro mostra aos pequenos como é o mundo de quem precisa do tato para conhecer o seu entorno. E vai além: a obra de Alexandre Azevedo é inclusiva ao trazer a história em braile para que as próprias crianças cegas consigam ler, não nos deixando esquecer que representatividade é importante.

2. Rodas, pra que te quero! – Angela Carneiro e Marcela Cálamo

A pequena Tchela andava para cima e baixo com a sua bicicleta, até que ela descobriu que isso não seria mais possível. E as duas rodas que a levavam para conhecer o mundo, precisaram ser substituídas por quatro de uma cadeira de rodas. E se a tristeza se fez presente logo de cara, a garotinha deu um jeito de se lembrar que as suas aventuras não precisavam ser interrompidas pelo seu novo jeito de andar. Ela estava pronta para continuar a explorar o mundo!

A história desta garotinha de tranças loiras é ainda mais singular por ter sido inspirada em fatos reais. Marcela Cálamo, uma das autoras do livro, é cadeirante desde os seis anos de idade. Mesmo precisando aprender um novo jeito de se locomover, isso não a impediu de tornar-se professora, casar e ser mãe de dois filhos.

3. Pássaro Amarelo – Olga de Dios

Em uma fileira de ovos que estão prestes a quebrar para que novas vidas venham ao mundo, nasce o pássaro amarelo. Do lado de outros bichanos, ele começa a se comparar e percebe que diferente deles, suas asas não cresceram. Só que a portinha da frustração abre o caminho para um pássaro para lá de criativo que, junto com o seu amigo Téo, o macaco carteiro, estão prontos para descobrir um jeito de colocá-lo no ar.

A história é uma bela jornada sobre como os limites físicos não nos impedem de realizar grandes conquistas, especialmente quando bons amigos estão do nosso lado.

4. O silêncio de Júlia – Pierre Coran e Mélanie Florian

Junto com ilustras delicadas, a história de Júlia traz as idas e vindas de como crianças também precisam de um tempo próprio para aprenderem as diferenças que existem entre seus pares e conseguir respeitá-las. É assim quando a garotinha percebe que ganhou um novo vizinho, André. Ele surge mal humorado por ter se mudado da cidade grande, onde tinha vários amigos, para o interior – lugar em que só parecia ter Júlia para brincar.

Ela tenta se aproximar dele, mostrar como é o seu mundo. Mas depois de algumas tentativas frustradas e a explicação da sua mãe de que André não entendia que ela era surda, Júlia recua e espera que as peças se encaixem naturalmente para que ela retome sua autoconfiança e tente uma nova amizade com o vizinho. A história tem uma sensibilidade poderosa de mostrar que, muitas vezes, a falta de conhecimento machuca o outro e por isso precisamos falar sobre diversidade.

5. Tudo bem ser diferente – Todd Parr

O autor Todd Parr é conhecido por suas séries de livros que tratam de assuntos subjetivos, mas que merecem um espaço importante no diálogo com as crianças. Inclusive, é o que aparece na sua obra “Tudo bem ser diferente”.

Com ilustrações e frases mais simples, o pequeno terá contato com a diversidade física que as pessoas podem ter. Seja ela uma diferença física, como dentes a mais ou a menos, ou o formato diferente do cabelo. Seja uma deficiência física, que pede um novo jeito de encarar o mundo. Pela simplicidade da história, o livro é uma ótima aposta para os menores.

6. Clara, a ovelhinha que falava por sinais – Cristina Klein

Começar em uma escola nova não é um processo fácil e não foi diferente com a ovelhinha Clara. Só que mais do que precisar fazer novos amigos e entender o que era o tempo longe da família, ela estava ali para aprender a linguagem de sinais, pois era deficiente auditiva.

Como a maioria dos começos em que o medo toma conta de nós, ela não gosta da escola e não vê a hora de sair daquele lugar. Mas com o passar dos dias, ela vai aprendendo os sinais, consegue se comunicar, ser entendida e assim fica mais fácil administrar a ideia de ter amigos com quem consegue dividir tudo o que está pensando, sentindo e querendo. O nome disso é inclusão!

7. A vida com Logan – Flavio Soares

Mesmo com tanto carinho e nobreza, crianças com deficiência acabam se deparando com um mundo que não é tão gentil com elas, especialmente quando menores. Mas no livro de Flavio Soares, ele conta a história do seu filho Logan com Síndrome de Down com um olhar mais delicado: ele é focado em contar para outros pais sobre a beleza que existe em enxergar o mundo com os olhos do pequeno.

A obra mostra o dia a dia de Logan, desde a chegada na escola, a relação com os amigos, a preparação das atividades pela professora, e a superação dos desafios diários que surgem. No final do livro, há também uma sequência de fotos do próprio Logan para que o público possa conhecê-lo para além das ilustras e informações importantes sobre a Síndrome de Down.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Startup curitibana democratiza ensino online de Libras e quer capacitar 100 mil alunos

PorGazzConecta, com colaboração de Millena Prado Z | gazetadopovo.com.br

A startup Duolibras ensina Libras com foco no público ouvinte.| Foto: Duolibras/Divulgação

Como seria morar em um país onde quase ninguém compreende a sua língua? Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 10 milhões de pessoas no país têm algum grau de deficiência auditiva, de leve a severa. Foi para democratizar o ensino da Língua Brasileira de Sinais e promover a inclusão de surdos que Marcio Ballera e Manolo Torres fundaram, em 2018, a DuoLibras.

A startup curitibana oferece um curso online de Libras que mescla ensino e entretenimento, funcionando como um seriado com com 120 episódios. O curso tem duração de seis meses e certificado de conclusão. Em três anos de atuação, a startup já capacitou 2,4 mil alunos — e a meta dos empreendedores a longo prazo é chegar aos 100 mil.

Viver em um país em que poucas pessoas sabem se comunicar em Libras coloca barreiras para os surdos, que podem enfrentar isolamento social, afetivo e profissional.

Manolo Torres, também conhecido como Manolo Libras, percebeu muito cedo a existência dessa barreira, criando problemas de inclusão Quando criança, ele participou de um grupo de surdos na igreja em que frequentava. Conquistando rapidamente a fluência, passou a ajudar os colegas com deficiência em tarefas cotidianas como intérprete.

Márcio Ballera e Manolo Torres, fundadores da Duolibras. | Sony/Divulgação

Mais maduro, ao desenvolver trabalhos em startups voltadas para a capacitação de deficientes na área de tecnologia, viu que o caminho mais democrático era o inverso: pessoas com habilidades auditivas plenas, sem deficiência, deveriam se adaptar para se comunicar também com surdos.

"O foco da DuoLibras é ensinar a língua de sinais para o ouvinte. O português não é a primeira língua dos surdos. Por isso, um dos nossos objetivos é disseminar o conhecimento sobre o idioma e sobre a cultura surda", descreve o confundador Marcio Ballera.

DuoLibras no Shark Tank

Os fundadores participaram, em dezembro, da quinta temporada do Shark Tank Brasil, reality show de investimentos em startups no qual investidores avaliam as empresas através da apresentação de um pitch.

Os empresários fizeram uma proposta nada comum aos investidores: 2% da empresa em troca de 15 minutos semanais de mentoria, ao longo de seis meses, com o objetivo de alavancar o crescimento da empresa. A proposta foi aceita pelos tubarões.

A participação rendeu bons frutos à curitibana. Até setembro de 2020, o faturamento da empresa havia chegado a R$ 80 mil. Após a exibição do episódio, a DuoLibras faturou metade desse valor em apenas um mês.

Para o futuro, a ideia da startup é expandir o mercado e atingir novos públicos. Atuando hoje no modelo B2C (Business to Consumer), direto ao consumidor, a ideia é expandir o serviço para vendê-lo para empresas como forma de treinamento para funcionários. “Focar também no B2B (Business to Business) é uma forma de escalar agressivamente e inserir a cultura da Libras dentro das empresas”, conta Ballera.

A DuoLibras também já testa a operação adaptada para franquias de ensino expandindo a atuação e o número de alunos. As duas novas frentes de atuação estão em negociação com futuros clientes. “Queremos ser referência e dar visibilidade à língua de sinais. Mostramos que é possível ter um negocio rentável e socialmente impactante”, finaliza Marcio.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Autismo e adolescência: quais os principais desafios?

Autismo e adolescência são temas que enchem de preocupação os pais e os profissionais das mais diferentes áreas. Como uma pessoa com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) enfrenta a adolescência? Como prepará-la para essa fase tão complicada e cheia de desafios?

grupoconduzir.com.br

Para esclarecer essas dúvidas, entrevistamos (Entrevista cedida para o site Esporte e Inclusão) a psicóloga Marina Ramos, Analista de Comportamento, Especialista em Autismo, Consultora e Supervisora ABA (Análise do Comportamento Aplicada) do Grupo Conduzir.

Tiago Toledo: Adolescência é, por si só, uma fase cheia de desafios (escola, sexualidade, autocobranças, entre outros). Como um adolescente autista (leve ou moderado) lida com tudo isso?
Marina Ramos:
 A adolescência é uma fase cheia de desafios para todas as pessoas e acredito que para os autistas ela seja mais exacerbada, pois esses desafios se tornam mais frequentes. Há uma forte demanda de habilidades sociais, como a parte da sexualidade, autoestima, responsabilidades, depressão, ansiedade e comportamentos muito rígidos. São muitas decisões a serem tomadas e, no caso do adolescente leve ou moderado, há uma dificuldade de entender o que está acontecendo e ele começa a perceber que há algo diferente com ele.

Tiago: Como assim? Que tipo de comportamento diferente o adolescente autista costuma perceber em si mesmo em relação aos demais jovens?
Marina: 
Ele começa a ver que os colegas estão evoluindo, fazendo escolhas, namorando, e a dificuldade na área social é uma característica do autista. Ele geralmente não consegue se inserir de forma adequada. Há uma vontade, mas, ao mesmo tempo, o adolescente autista não se encaixa nos grupos. Portanto, é extremamente essencial que esses adolescentes autistas estejam bem acompanhados por especialistas e por tratamentos adequados, para que as questões típicas dessa fase não se tornem mais problemas a serem resolvidos.

Tiago: E o adolescente com autismo de grau severo, como enfrenta essa fase?
Marina: 
O adolescente com autismo mais severo tem mais dificuldades, uma vez que ele já apresenta uma questão cognitiva mais séria. Ele não é independente e muitas vezes a fala não está bem desenvolvida, prejudicando a comunicação. Com isso, as demandas sociais se tornam mais altas e o adolescente com grau de autismo severo tem mais dificuldade de discriminar as situações. Porém, as mudanças biológicas e hormonais acontecem da mesma forma que para os demais adolescentes e existe um desafio maior para se expressar, de entender essas mudanças, principalmente biológicas. Na fase da sexualidade, a masturbação fica muito em alta. Desse modo, é necessário um trabalho de adequação social para esses autistas. Outro ponto a ser trabalhado com o autista de grau severo é a independência funcional, ou seja, como se trocar, comer e tomar banho sozinho.

Tiago: Alguns especialistas dizem que os adolescentes autistas, de graus leve e moderado, apresentam grande dificuldade de compreender a intenção do outro e acabam sendo enganados com facilidade. Você concorda? Como blindar o autista dessa situação?
Marina: 
Sim. Os adolescentes com TEA, independentemente do grau de autismo, têm bastante dificuldade de entender os sinais do ambiente, de entender piadas e metáforas. A ingenuidade é muito grande e, por isso, outras pessoas podem enganá-los com facilidade, fazer brincadeiras que eles não vão entender. Portanto, nessa fase a gente precisa se certificar de que esse adolescente está sendo acompanhado da forma correta com um especialista. Ele precisa desenvolver habilidades de leitura do ambiente, de consciência. É preciso treinar esse adolescente para que ele entenda metáforas, piadas e noções de perigo, para que ele não seja negligenciado ou abusado por nenhuma outra pessoa e tenha condições mínimas de entender os sinais e saber se aquelas situações pelos quais ele está passando são adequadas ou não. Isso faz parte do desenvolvimento.

Tiago: Como é feito esse entendimento de ambiente?
Marina: 
Entender sinais do ambiente é difícil até mesmo para pessoas comuns. É uma habilidade muito complexa. Por exemplo: se todo mundo está rindo de uma piada e olhando para mim o que que isso significa? A piada é de mim, é porque eu não estou rindo ou entendendo? Quais são os sinais que esse ambiente está me dando que identificam que eu estou sendo passado para trás? Para que os adolescentes autistas tenham essa compreensão, existem treinos estruturados baseados em análise do comportamento aplicada planejada por um especialista, de forma que haja aprendizagem consistente.

Tiago: Recentemente, houve uma atualização no número de diagnósticos de TEA, não é verdade?
Marina: 
Sim, a incidência de autismo está aumentando. De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CD), dos Estados Unidos, existe uma pessoa autista para cada 59 crianças. É um número bastante alto que, mais cedo ou mais tarde, vai se tornar um problema de saúde pública. Essas crianças estão crescendo, vão se tornar adolescentes e adultos. Se a escola, por exemplo, não estiver preparada, bem como a sociedade, a gente vai ter um problema bem grande. Quem vai ensinar essas pessoas a serem funcionais e independentes?

Tiago: Por falar em escola, como você acredita que ela pode influenciar nessa fase da adolescência? O que cobrar dos professores?
Marina: 
A escola precisa ter uma preparação teórica e prática de como incluir esses adolescentes de forma eficiente na grade do ensino, como adaptar material. E os professores precisam ter formação e condições para lidarem com esse público diferenciado. Os autistas conseguem aprender, é um cérebro que funciona de uma forma diferente. Portanto, eles aprendem de uma forma diferente e a escola não está preparada para ensinar dessa forma diferente, mas sim para ensinar a média. Mas eu acredito que a escola sempre pode influenciar, não só na fase da adolescência quanto em qualquer fase, porque é um local onde a criança passa a maior parte do tempo e, com certeza, a aprendizagem acadêmica e social está muito ligada a esse período que ele está na escola.

Tiago: Qual o papel dos pais na vida de um adolescente autista? É possível responder a esta pergunta de maneira geral ou tudo depende do grau de autismo?
Marina: O papel dos pais na vida de um adolescente autista é fundamental, independentemente do grau de autismo. Essas pessoas precisam da presença dos pais, que terão a missão de educar. O comportamento adolescente é um período mais difícil, os hormônios estão à flor da pele e há uma tendência de rebeldia do autoquestionamento. Essas questões são naturais para todo mundo e para os adolescentes autistas, como falado anteriormente, vão se potencializar. Sendo assim, penso que o papel dos pais para qualquer adolescente seja de extrema importância para que essa transição seja o mais agradável e o menos conflituoso possível, para que o adolescente passe por essa fase com autoestima, responsabilidade e autoconfiança.

Tiago: As terapias para autistas dependem de uma equipe multidisciplinar. Quando a criança chega à adolescência os profissionais mudam? Como é feito esse acompanhamento?
Marina: 
O tratamento do autismo sempre precisa de uma equipe multidisciplinar (analista do comportamento, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, professor de educação física, entre outros). Quando a criança chega à adolescência, esses profissionais não necessariamente mudam. O que mudam são as demandas. Na intervenção precoce a gente trabalha habilidades de base, imitação motora, segmento de comandos e a própria fala. Quando essa criança vai crescendo, a gente tem demandas acadêmicas e sociais mais explícitas de iniciação de conversa, brincadeira, faz de conta. Na adolescência, as demandas vão passando para identificação, autoconsciência, identificação de desafios e qualidades que esse adolescente tem e o que a gente pode desenvolver e potencializar para gerar independência para, de repente, essa pessoa seguir para uma orientação profissional, inserção no mercado de trabalho e faculdade. O acompanhamento de um psiquiatra durante todo esse período também é extremamente importante para que haja avaliação da necessidade de medicação ou não durante todos os períodos e na adolescência.

Tiago: E como essa falta de profissionais afetam os pais?
Marina
: Os pais sentem muita dificuldade em encontrar profissionais que trabalhem com essa faixa etária. Por isso, cada vez mais importante que os profissionais da análise do comportamento saibam como trabalhar o autismo na adolescência e fase adulta, inserção no mercado de trabalho, faculdade, enfim, para que os pais consigam ser melhor assistidos nesse período da vida dos filhos.

Tiago: Quais riscos um adolescente autista corre, caso não tenha o acompanhamento adequado?
Marina:
 O autista adolescente ou adulto tem tantas necessidades quanto as crianças autistas. A intervenção precoce é importante, mas na adolescência e na vida adulta também é primordial, para que o adolescente autista não entre em depressão ou ansiedade, que são os diagnósticos com morbidades muito comuns nessa fase. As demandas sociais estão muito altas e as habilidades sociais e os comportamentos rígidos podem levá-los a desenvolver TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo). Os adolescentes autistas precisam aprender a lidar com as situações de conflito do dia a dia que vão surgir. Entretanto, eles não conseguem aprender isso de forma natural e vão precisar de um treino estruturado e intensivo para que isso seja possível.

Fonte: Conteúdo publicado em 19 de julho de 2018 pelo site esporteeinclusao.com.br – com modificações.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

“Pessoas com deficiência sempre foram segregadas e invisibilizadas dentro da sociedade”, dizem especialistas

brasil247.com

À TV 247, a professora e ativista Cátia Brito e a especialista em inteligência emocional Simone Urbano disseram que o capacitismo faz parte de um processo histórico, social e político que normatiza o preconceito e a exclusão de pessoas com deficiência física. Assista

247 - O programa “Um Tom de resistência” desta semana, na TV 247, abordou o tema capacitismo e discutiu a pré-concepção estabelecida sobre as capacidades que uma pessoa tem ou não, devido a uma deficiência que possui. “O termo ‘capacitismo’ é relativamente novo, mas toda pessoa com deficiência já passou por uma situação de preconceito e de discriminação. Existe todo um contexto histórico, social e político que as pessoas com deficiência estão envolvidas. O capacitismo tem várias vertentes que mantém invisibilizadas as pessoas com deficiência e precisamos encarar esse desafio para tentar desenvolver o nosso potencial e exercer o nosso direito de cidadania”, explicou Cátia Brito, que é fisioterapeuta e mestranda em educação científica.

Para a palestrante Simone Urbano “o capacitismo é um problema estrutural e histórico. É preciso desconstruir esses conceitos que se tornaram crenças, e crenças são paradigmas que foram estabelecidos desde que o mundo é mundo. É importante trazermos esse tema à tona e fazermos o que estamos fazendo aqui. Debatendo a questão. Se cada um fizer a sua parte, a sociedade civil, as empresas, o governo, a coisa pode deslanchar e conseguiremos destruir esse conceito de fora do comum e imperfeito, sob o qual pessoas com deficiência são classificadas. Eu sou uma pessoa com uma síndrome genética e a própria ciência ainda nos enxerga como imperfeitos. Precisamos mudar essa visão”, disse.

Outra questão abordada no programa foi a tradição ainda cultivada por algumas etnias indígenas do Brasil, que sacrificam recém-nascidos que nascem com alguma deficiência física, acreditando que a deficiência é uma maldição imposta sobre eles. “Eu já tinha conhecimento dessa prática e acho um absurdo e uma atrocidade. É complexo, por se tratar de uma crença espiritual dos indígenas. Talvez, o governo pudesse intervir nessa situação, promovendo políticas públicas que conscientizassem os indígenas de que é possível que uma criança com deficiência possa se desenvolver e conviver em sociedade”, disse Simone Urbano.

Cátia Brito compartilha da mesma opinião. Para ela o caminho é o diálogo. “Temos um fundamento jurídico para evitar isso, que é o tratado dos direitos humanos. A própria convenção dos direitos das pessoas com deficiência, que foi um tratado internacional assinado por vários países. Então, isso não é uma questão apenas do Brasil, mas uma questão signatária de vários países que se comprometeram a proteger a vida das pessoas com deficiência. É preciso levar aos indígenas esse conhecimento acerca da defesa dos direitos humanos. E apesar de suas crenças serem uma questão para além do que nós pensamos, o fundamento legal é importante para estabelecer esse diálogo”, explicou.

A criação de políticas públicas para combater o capacitismo, como se defender de práticas capacitistas no mercado de trabalho e o uso de expressões capacitistas normalizadas no nosso dia a dia também foram abordadas na pauta do debate.