A queda de um dos grandes dogmas da medicina pode estar próxima
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A síndrome de Down é uma condição genética que não tem cura. Um estudo espanhol demostrou que um composto extraído do chá verde é capaz de melhorar a capacidade intelectual e cognitiva de pessoas com síndrome de Down. Essa é a primeira vez que um tratamento tem resultados positivos para minimizar os efeitos da síndrome.
Ela atinge uma pessoa a cada mil no mundo e acontece quando há 3 cromossomos 21 em todas ou em grande parte das células de um indivíduo. Os portadores dessa trissomia têm 47 e não 46 cromossomos, como a maioria da população. Essa cópia extra altera a formação do corpo e do cérebro. Crianças com síndrome de Down têm mais dificuldades no desenvolvimento intectual e as características físicas são facilmente reconhecíveis, como uma única risca na palma da mão e o nariz achatado.
A descoberta espanhola é importante porque o composto pode ajudar a regular a expressão de alguns dos mais de 300 genes do cromossomo 21, inclusive aqueles responsáveis pelo atraso cognitivo, pela capacidade de memorização e pelas conexões neurais. Apesar de não atenuar todos os efeitos da síndrome de Down, o estudo abre portas para novas investigações dessa alteração genética que, até então, era órfã de tratamento e só dispunha de vitaminas, hormônios e outras substâncias sem comprovação científica.
A pesquisa, recém-publicada na revista Lancet Neurology, foi conduzida pelo Centro de Regulação Genômica em parceria com o Instituto Hospital del Mar de Investigações Médicas de Barcelona e dividida em duas etapas: a primeira com ratos e a segunda com 84 pessoas.
Na primeira fase, os cientistas identificaram o gene DYRK1A, associado à formação do cérebro e superativado pelo cromossomo extra. Esse gene produz proteínas em excesso relacionadas a alterações cognitivas – 1,5 vezes mais em pessoas com Down. O polifenol presente no chá verde, a epigalocatequina galato, inibe e normaliza a produção da enzima DYRK1A. Além disso, ele é capaz de melhorar algumas capacidades intelectuais e altera os estímulos e conexões do cérebro de portadores da síndrome de Down.
Cientes da capacidade do composto de chá verde de modificar a plasticidade do cérebro, os pesquisadores decidiram testá-lo em humanos. No total, 84 pessoas com síndrome de Down entre 16 e 34 anos participaram: a metade deles recebeu um placebo e fazia exercícios de estímulo cognitivo; o outro grupo fez os mesmos exercícios, mas, ao invés de placebo, tomou 9 miligramas de epigalocatequina por peso diariamente durante um ano.
Depois disso, os participantes responderam uma série de testes para medir suas habilidades intelectuais, motoras, de comportamento e memorização. Naqueles que tomaram o extrato foi possível notar uma leve melhora na memória a curto prazo, na capacidade de se organizar no dia a dia, de se adaptar e uma diminuição na impulsividade. As imagens do cérebro dos pacientes mostram um aumento das conexões neurais na região frontal do cérebro, o que sugere que, de fato, houve um aumento no processamento de informações.
Uma das líderes do estudo, a neurocientista Mara Dierssen, explica que, apesar das mudanças observadas nos testes finais não terem sido muito significativas (não apresentaram evolução em 13 dos 15 testes), elas foram suficientes para que os pais de quase todos os voluntários pudessem perceber se o filho tinha tomado o tratamento de chá verde ou o placebo.
Não tente fazer isso em casa
Mas não se engane, a solução não está necessariamente dentro de um saquinho de chá. Para igualar na xícara a quantidade de epigalocatequina que os voluntários tomaram durante o experimento, deveriam ser consumidas oito xícaras de chá verde por dia ao longo de um ano todo. Além de ser uma quantidade absurda da bebida, existe uma infinidade de marcas de chá verde que possuem outros componentes junto com o extrato. Os pesquisadores alertam para que as famílias consultem seus médicos de confiança e não se atirem no mercado atrás de qualquer susbtância.
Os pesquisadores pretendem continuar as investigações, mas, dessa vez com meninos e meninas portadores da síndrome de Down. A explicação é simples: as mudanças cerebrais são limitadas em adultos, porque o cérebro já está totalmente desenvolvido, mas se o tratamento for aplicado em crianças, a esperança é de que os efeitos sejam ainda melhores.
Por Pâmela Carbonari para a Superinteressante