Entre os profissionais, é consenso que pessoas com TEA quase sempre apresentam alguma forma de particularidade sensorial, respondendo de forma incomum a estímulos. Com o Bernardo, estas questões foram trabalhadas durante alguns anos pela terapeuta ocupacional, através da terapia de Integração Sensorial, que é uma técnica que foi preconizada pela terapeuta ocupacional americana Jean Ayres. As intervenções são baseadas no pressuposto de que quando existe uma disfunção sensorial todo o sistema de autorregulação é alterado e que isso pode afetar o desenvolvimento das habilidades básicas, motoras, de comunicação e de interação social.
Por mecanismos de autorregulação podemos pensar em estratégias que desenvolvemos, centradas em nós mesmos. Algumas dessas estratégias podem se manifestar através de estereotipias (stims), fazendo com que alguns pais e terapeutas tentem a todo custo “arrancá-las” dos filhos (e pacientes), pelo simples fato de que algumas delas acabam por “denunciar”o autismo. Muitas vezes, por trás de um discurso politicamente correto existe apenas o desejo de que aquela criança consiga passar por “normal” aos olhos dos outros, o que é uma violência.
Por qual motivo o meu hábito de, em momentos de ansiedade, roer unhas, morder tampas de canetas e balançar pernas não seria considerado um problema, mas o de uma criança fazer flapping quando está feliz, seria motivo de intervenção?
Tal questão me remete a uma fala de Clarice Lispector, que diz que “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.”
Não estou dizendo que o uso de stims seria um defeito, e sim que as estereotipias existem e estão ali por alguma razão. Quando há a tentativa de extirpá-las, isso é feito sem considerar que, às vezes é tal mecanismo que permite que a pessoa consiga enfrentar várias situações do dia a dia, envolvendo sobrecargas sociais e sensoriais. Ademais, podem também auxiliar na concentração e na capacidade de levar uma tarefa até o final. Neste caso, valeria a pena a tentativa de “arrancar” isso, mesmo sabendo que tal mecanismo poderia estar a sustentar um edifício inteiro?
Obviamente, em alguns casos, a busca por regulação ou estímulos pode fazer com que o indivíduo coloque a si ou aos outros em algum tipo de risco. É este o caso? Ok, penso que é válido que determinado comportamento seja impedido/desencorajado. Mas, se o objetivo é apenas que nosso filho pareça “menos autista” aos olhos de quem quer que seja, que consigamos olhar para dentro e reavaliar nossas próprias posturas.
Por Érika Andrade para o criancaesaude.com.br
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