Acessibilidade continua sendo escassa quando se trata de odontologia
Catherine Saint Louis para o The New York Times
Jackie Molloy / NYTNS
Cheryl Closs tem quatro filhos e mora em West Islip, Nova York. Ela queria salvar os dois dentes da frente de sua filha Bella. Eles estavam gravemente cariados e um dentista queria arrancá-los. Mas Closs não concordou.
Bella, que tem 15 anos e está no oitavo ano, tem necessidades especiais e usa uma cadeira de rodas.
"Eles logo querem arrancar os dentes de uma criança que tem necessidades especiais", disse Closs. Então, ela começou uma busca por um especialista em tratamento de canal. Bella não iria à escola durante um dia e seu marido as levaria a qualquer distrito para uma consulta odontológica. Mas levaram Bella a oito dentistas e especialistas em canal, pelo menos, e todos se recusaram a tratá-la. Alguns "nem sequer olharam para os dentes. Isso já aconteceu muitas vezes", disse Closs.
Bella gosta de tranças e de camisetas da Mulher Maravilha, sorri bastante, mas não fala muito e não gosta de ser tocada. Ela tem uma doença genética chamada fucosidose, que deteriora o funcionamento cerebral. Fazer um raio X ou uma limpeza de dentes pode ser um desafio, exigindo mais tempo ou mais gente para segurar sua cabeça ou seus braços.
E muitos dentistas não podem – ou não querem – tratar pacientes com deficiências. Alguns não têm como acomodar fisicamente uma cadeira de rodas, "ou não se sentem confortáveis tratando deles", disse a dra. Rita Bilello, diretora odontológica do Centro de Saúde Metro Community no Brooklyn, em Staten Island e no Bronx.
Normalmente, os odontopediatras aprendem a tratar pacientes com necessidades especiais, mas não os dentistas gerais. Isso significa que uma criança com autismo pode fazer check-ups regulares, mas não necessariamente depois de adulta.
Porém, em 2006, um novo padrão para programas odontológicos entrou em vigor. A Comissão de Acreditação Odontológica determinou que todos os alunos precisam ser capazes de avaliar competentemente as necessidades de tratamento de pacientes especiais. Mas, desde 2012, menos de três quartos das escolas de odontologia têm estudantes de pré-doutorado ativamente envolvidos em seu tratamento, de acordo com um estudo publicado em "Journal of Dental Education".
O acesso continua a ser um grande problema para pacientes com necessidades especiais. Mas o Centro de Saúde Bucal para Pessoas com Deficiências, da faculdade de odontologia da Universidade de Nova York (NYU), oferece uma nova opção para pacientes como Bella. É um dos raros locais que tratam de adultos e crianças com todo o espectro de deficiências – aqueles com atrasos no desenvolvimento, como o autismo e as inabilidades intelectuais, ou circunstâncias como a paralisia cerebral e a demência. Há duas salas de operação onde os pacientes que não conseguem ficar parados na cadeira podem ser sedados.
Além de ampliar o acesso dos pacientes, o centro da NYU tem como objetivo formar todos os seus alunos com as habilidades e a confiança imprescindíveis para cuidar de pacientes com necessidades especiais.
O dr. Ronald Kosinski, dentista pediátrico e diretor do novo centro, não mede as palavras. Os pacientes com deficiências não conseguem tratamento porque "as pessoas têm medo deles. Eles não são vistos como pessoas. Precisamos treinar os alunos de odontologia para que comecem a aceitá-los".
A NYU forma aproximadamente 10 por cento dos dentistas do país, portanto o novo centro poderá causar um grande impacto. "Você pode não perceber que é capaz de tratar um esquizofrênico em uma cadeira de rodas com paralisia cerebral até que tenha a oportunidade de tentar", disse Bilello.
A procura é grande. Cerca de 915 mil pessoas com alguma deficiência vivem na cidade de Nova York, de acordo com o Gabinete Municipal para Pessoas com Deficiência. Isso é potencialmente um monte de dentes não tratados.
"O acesso aos cuidados é um problema enorme", disse o dr. Alan N. Queen, encarregado de uma clínica odontológica para pessoas com necessidades especiais no Centro Médico New York-Presbyterian Queens. "O problema é que os pacientes com necessidades especiais são difíceis de tratar se comparados com o paciente médio, e, infelizmente, o seguro pode não pagar."
Queen, que também tem um consultório em Flushing, no Queens, disse que, para tratar um paciente com os tremores do Parkinson, por exemplo, ele precisa de um assistente para "segurar a cabeça, outro para segurar a língua, outro para a sucção, e eu fazendo o trabalho dentário". Consultórios odontológicos deveriam obter reembolso adicional para esses casos, disse ele.
Em outubro passado, a Associação Odontológica Americana atualizou seu código de ética para especificar que os pacientes com deficiências não devem ter o serviço odontológico negado. No mínimo, diz o código, os dentistas que não puderem tratar um paciente devem encaminhá-lo a outro profissional.
Foi assim que Bella teve sua chance. Recentemente, quando um funcionário de um consultório odontológico ligou para cancelar uma consulta no dia anterior por causa da cadeira de rodas de Bella, Closs começou a chorar: "Você me fez esperar seis meses." Um gerente do escritório pegou o telefone e encontrou uma solução.
Após alguns dias, Bella foi levada para a NYU, terminando sua epopeia.
Inúmeros deficientes nova-iorquinos evitam visitas ao dentista, uma vez que muitos consultórios não são acessíveis a cadeiras de rodas, uma violação da Lei dos Americanos com Deficiência. "O propósito da lei é garantir que as pessoas com deficiências tenham os mesmos direitos e oportunidades que todas os outras", disse Jonathan Novick, gerente do Gabinete Municipal para Pessoas com Deficiência. "Portanto, elas têm o mesmo direito à higiene dentária que todo mundo."
Mesmo quando conseguem entrar em um consultório odontológico, os pacientes em cadeiras de rodas enfrentam um obstáculo adicional: os assistentes muitas vezes têm de movê-los para a cadeira odontológica, ou mecanismos desajeitados podem ser usados. "Para um paciente confinado a uma cadeira de rodas, passar de uma para outra é uma fonte de ansiedade", disse o dr. Charles Bertolami, reitor da faculdade de odontologia da NYU.
O novo centro da NYU facilitou as coisas. Em uma visita recente, Bella teve sua cadeira travada em uma poltrona reclinável especial, e foi então inclinada para trás para que seus dentes fossem inspecionados. Há 24 dessas poltronas nos Estados Unidos, de acordo com John Walters, designer da Design Specific, a empresa que as produz. No primeiro mês do centro, cerca de metade dos pacientes as usou, disse o dr. Robert Glickman, cirurgião oral.
Em meados de abril, os dentistas da NYU determinaram que Bella poderia fazer o tratamento de canal para reparar seus dois dentes. Uma semana depois, seu sorriso havia sido corrigido.
"A maneira como a fizeram se sentir foi algo importante para nós", disse Closs. Joe Dockery, pai de Bella, acrescentou: "Eles a tratam como a uma filha."
Bella mostrou seu agradecimento a seu modo: após sua primeira visita, ela abraçou o dentista.
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