segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Preconceito

Desde que a “onda” do politicamente correto ganhou força e parte da sociedade se conscientizou  que somos  TODOS  iguais (ou, pelo menos, deveria ter se conscientizado), vem sido propagada aos quatro ventos a importância e necessidade vitais de vivermos em comunhão.
Mas, juntamente com o politicamente correto, um outro termo surgiu e veio para ficar: o PRECONCEITO! A partir do momento em que todos nós (ou quase todos, infelizmente!) internalizamos este conceito, passamos a compreender também que tudo aquilo que fosse de encontro a essa nova concepção, se tornaria errado,  constituindo  preconceito.
Mas, afinal, o que quer dizer a palavra preconceito?
Vamos à sua etimologia:A palavra preconceito é formada pelo prefixo latino “pré” (anterioridade, antecedência) mais o substantivo  “conceito” (opinião, julgamento). Assim sendo, percebemos que o preconceito nada mais é do que um conceito pré-estabelecido acerca de algo ou alguém. Desde os primórdios da humanidade que o ser humano tem dificuldade em conviver com as diferenças, pois tudo aquilo que é diferente, choca, assusta e nos tira da chamada “zona de conforto”.
Mas onde quero chegar com toda esta conversa acerca de preconceito? É bem provável que a esta altura do texto você deve estar fazendo esta pergunta…
Dez entre dez mães de pessoas com autismo, quando perguntadas sobre as maiores dificuldades que enfrentam diariamente, mencionam o preconceito em seus depoimentos.
Mais do que um simples fato, isto é uma triste realidade! Realidade esta que os movimentos de pais e mães, Brasil afora, têm lutado bravamente para mudar!
Entretanto, será que nós, que sabemos o quanto o preconceito machuca e fere, pois sentimos na pele e na alma os seus efeitos devastadores, somos preconceituosos?
Vamos acompanhar as frases abaixo:
“Meu filho tem TEA, transtorno do espectro autista, o que é MUITO diferente de autismo.”
“Meu filho tem autismo leve. Em razão disso, não gostaria que ele ficasse em um grupo  com crianças autistas mais comprometidas do que ele.”
Quantas vezes já escutamos estas falas em nosso cotidiano? Esta semana me peguei refletindo sobre isso…
São afirmações que surpreendem, principalmente por serem oriundas de mães de autistas.
A primeira frase mostra a fuga do termo autismo, como se a família tivesse “medo” desta nomenclatura. Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Transtorno Global do Desenvolvimento e, mais recentemente, Transtorno do Espectro Autista, são apenas algumas das nomenclaturas utilizadas para designar a mesma síndrome que abrange 1% da população pediátrica mundial, o autismo.
Penso que se nos prendermos a rótulos estaremos perdendo um tempo valioso. Que importância tem o nome da dificuldade que meu filho tem? Faz alguma diferença que ele tenha TEA, TGD ou  Autismo, por exemplo? As dificuldades, porventura, deixarão de existir com este ou aquele nome? Infelizmente, não.
As questões estarão ali,  sem mudança alguma, independente do nome que tenham.
Na segunda frase, a família demonstra preocupação pelo fato de seu filho, com “autismo leve”, ter que interagir com crianças com um comprometimento maior.
Interessante observar que esta, provavelmente, é a mesma família que luta para que seu filho seja incluído em uma escola regular, para conviver com crianças ditas “normais”.
Se as mães de crianças neurotípicas pensarem assim, o que será da inclusão? Não é justamente contra este tipo de pensamento que lutamos?
Atualmente, muito se fala dos “diferentes tons de azul”, expressão utilizada para denominar os diversos graus de comprometimento que o autismo apresenta.
Embora o autismo possa afetar cada indivíduo de forma única e diferenciada, penso que a dor que uma família sente ao ter um filho com este diagnóstico independe do tom de azul que seu filho tenha.
É óbvio e não cabe nenhum questionamento que, quanto mais grave for o comprometimento de uma pessoa autista, maiores serão os cuidados que ela inspira, assim como os obstáculos a serem ultrapassados, fazendo com que as dificuldades adquiram uma proporção muito maior.
O que não quer dizer, de forma alguma, que uma família com um filho considerado autista leve não sofra e não enfrente seus próprios percalços.
Em meu entendimento, é inconcebível julgar a dor alheia, assim como mensurá-la.
Não se pode e nem se deve comparar uma dor a outra. Dor não se julga!
Não pode haver, entre nós, diferenças oriundas pela nomenclatura do diagnóstico ou em razão do grau de comprometimento de nossos filhos. Afinal, são todos autistas! Cada um a seu jeito, com suas próprias limitações e habilidades.
E estes diferentes “tons de azul” não são um impedimento para nos irmanarmos na mesma dor pungente de termos nossas vidas modificadas pela síndrome de nossos filhos.
O autismo afeta a todos nós e não escolhe raça, cor, idade, classe social, profissão ou credo. Lutamos tanto contra o preconceito! Nossos filhos são vítimas quase que diárias dele!
Não sejamos nós, pois, algozes uns dos outros.
Lembremo-nos que toda forma de preconceito é odiável e odiosa, venha de onde vier e de quem vier.

Denise Aragão


Fonte:  http://www.mundoazul.org.br/

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