Do
original em Espanhol: “El desarrollo del lenguage y la inteligencia
em el autismo”
“O
desenvolvimento da inteligência está intimamente ligado ao
desenvolvimento da inguagem. Contudo, o quociente intelectual é um
critério, e não uma relação”. A frase que acabam de ler é de
Gerardo Aguado, e põe em relevância um aspecto fundamental e que
está muito ligado ao autismo e à visão que existe a respeito
deste transtorno e o qual tem muito a ver com a inteligência. Um dos
debates existentes na atualidade se refere precisamente aos aspectos
quantitativos e qualitativos da inteligência nos portadores de
autismo. Não podemos medir a quantidade da mesma forma que medimos a
qualidade da mesma, baseando-nos nos padrões que são válidos para
nós. De fato, a qualidade desta inteligência medida com base em
nossos padrões talvez invalide a própria medição. Podemos
remontar-nos ao caso de Victor de Aveyron, o “menino sevagem”
encontrado na França em 1799, o qual foi entregue a Jean Itard para
seu “tratamento” e processo de “civilização”. Victor
apenas desenvolveu a liguagem verbal, aprendeu algumas palavras e,
ainda que tivesse melhorado muito a nível de comportamento,
realmente não alcançou os objetivos que Itard pretendia, inclusive
tendo sido submetido a um processo de “sensibilização”, já que
a vida ao ar livre parecia tê-lo insensibilizado ao frio e ao calor.
De fato, a intervenção que Itard levou a cabo(largamente
documentada), trabalhou os aspectos de linguagem, sociabilidade,
sensorial, etc ainda que não com muito êxito. Na descrição que Itard
fez da primeira impressão que lhe causou o menino, descrevia-o como
“um menino desgradavelmente sujo, afetado por movimentos
espasmódicos e inclusive convulsões, que se balançava
incessantemente como os animais do Zoo, que mordia e arranhava a quem
se aproximava, que não mostrava nenhum afeto aos que lhe cuidavam e
que, em suma, se mostrava indiferente a tudo e não prestava atenção
a nada. De fato, se olharmos o caso de Gaspar Hauser, que ainda que
com certas similaridades, se existia um aspecto diferenciador
importante, é que apesar de que o menino de Aveyron tivesse
crescido supostamente em absoluto isolamento, Caspar Hauser ( apesar
de seu cativeiro ) se teve contato, ouvia a voz de seu captor, e após
a sua libertação desenvolveu uma linguagem verbal fluente.
Poderíamos relacionar isto com a etapa pré-operacional descrita por
Piaget, fase na qual a criança desenvolve os aspectos fundamentais
associados à linguagem, e que se inicia aos dois anos de idade e
finaliza aos sete anos. “As crianças têm etapas de
desenvolvimento; uma criança que alcançou a etapa pré-operacional
desenvolve uma representação mental do brinquedo e uma imagem
mental de como pegá-lo. Se a criança pode usar palavras para
descrever a ação, já o está cumprindo mental e simbolicamente com
o emprego das palavras. Um dos principais avanços deste período é
o desenvovimento da linguagem; a capacidade para pensar e
comunicar-se por meio das palavras, que representam objetos e
acontecimentos”(Piaget 1967). E ainda que estes dois casos não
tenham relação com os transtornos do espectro do autismo(TEA),
podem servir-nos como exemplo do conceito de “Isolamento” e seu
impacto no desenvolvimento da linguagem e portanto do desenvolvimento
de mapas de inteligência, tal e qual os entendemos. Este
desenvolvimento intelectual alterado ou diferente, no qual não
existe uma comunicação funcional, pode levar a desenhar modelos
diferentes dos processos cognitivos e intelectuais, tal como no caso
do menino de Aveyron, onde pelo mero fato de apresentar condutas
absolutamente diferentes não se pode definir se sua capacidade
intelectual está ou não afetada até o ponto de haver podido
sobreviver só, sendo uma criança em um meio hostil. Esta
adaptabilidade é o que gera uma configuração distinta de nossos
modelos intelectuais e portanto mostra resultados que podem variar de
forma considerável. Em outras palavras, existe um impacto direto do
nosso meio na construção dos nossos mapas de inteligência.
Mas
se damos um salto no tempo(2011), chegamos até o trabalho de
Patricia Kuhl, que nos explica os processos de aquisição da
linguagem desde o nascimento. De como o cérebro da criança elabora
padrões para ir configurando e preparando seu cérebro para o
momento da linguagem. No artigo “Aquisição da linguagem oral:
idioma materno ou idioma aprendido?”, teorizava baseando-se
precisamente nos princípios aqui relatados, donde se a aquisição
da linguagem é tardia por parte da criança com autismo, talvez não
possamos falar de uma linguagem materna propriamente dita, senão de
um idioma aprendido posteriormente. Segundo Ami Klin “O autismo se
cria a si mesmo na medida em que o caminho da aprendizagem se bifurca
em uma direção diferente da esperada. O autismo se auto-gera”, e
por isso, o quanto antes se intervenha, as probabilidades de que a
intensidade com que o autismo impacta diminuam são maiores. Quer
dizer, a severidade do autismo na grande maioria dos casos é
inversamente proporcional à qualidade e presteza da atenção
precoce. E obviamente, os aspectos relacionados com a comunicação
são os que permitirão que aspectos tão importantes como a
sociabilidade se possam dar de uma forma muito mais natural, sem ser
necessário intervir de forma intensa e/ou dirigir esta aprendizagem.
Daí a importância da detecção precoce. Os sistemas de
“Eye-tracking” começaram a dar informação sobre a
possibilidade de adiantar o diagnóstico, tal como afirma Ami Klin. E
esta urgência no diagnóstico é básica para iniciar a intervenção
na criança.
(continua...)
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