quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Crianças e jovens cadeirantes escrevem livros sobre rotina de deficientes físicos no Rio

Temas abordam mobilidade urbana, buracos em vias e falta de empatia em sala de aula




Por Larissa Caetano*, G1 Rio

A rotina e as dificuldades de deficientes físicos foram temas de livros escritos por crianças e jovens cadeirantes que moram no Rio. Alguns narraram problemas com buracos em vias, mobilidade urbana e até falta de empatia no ambiente escolar.

Cerca de 60 alunos da alfabetização especial e da pré-escola ao quinto ano do ensino fundamental foram desafiados a pensar sobre como transformar a cidade em um lugar melhor para todos.

Alguns desses estudantes, além de cadeirantes, têm comprometimentos neurológicos que limitam a fala, escrita e compreensão e, por isso, precisaram de auxílio das mães e professores para escrever e desenhar o enredo das histórias.

O aluno Carlos Alberto escreveu sobre as suas dificuldades para andar de ônibus no Rio. — Foto: Larissa Caetano/G1
O aluno Carlos Alberto escreveu sobre as suas dificuldades para andar de ônibus no Rio. — Foto: Larissa Caetano/G1

O estudante da alfabetização especial Carlos Alberto Vasconcelos, de 15 anos, contou a história de um menino que gostava de andar de ônibus, mas tinha obstáculos para sair de casa. O personagem representa o próprio aluno, que se depara com buracos nas ruas, ônibus lotados e locais sem rampas.
“No livro, o meu filho conta a dificuldade do Dudu, que é um menino cadeirante, também como ele. Conta tudo que ele passa no transporte, como elevador ruim, motorista que não sabe acessar a rampa do ônibus”, disse Dulcimar Vasconcelos, mãe de Carlos.
Ela contou ao G1 que o filho gostou da experiência.

“Ele está muito feliz. Dá para ver no rosto dele a felicidade”, comemorou a mãe.

Com um tema parecido com o do amigo de sala, o jovem Yan Carlos, de 20 anos, escreveu sobre as condições das calçadas. A mãe do menino, Telma Lima, lembrou que o caminho dos dois é marcado por buracos e vias em péssimo estado de conservação.

“Nós achamos bem fácil escrever esse livro por causa dos problemas que a gente tem no nosso dia a dia. Eu ajudei o Yan a escrever o livro por conta da dificuldade que ele tem de leitura, de escrita. Eu escrevi tudo e fiz os desenhos”, contou Telma.

Yan Carlos, estudante da alfabetização especial, lançou um livro sobre as condições das calçadas.  — Foto: Larissa Caetano/G1
Yan Carlos, estudante da alfabetização especial, lançou um livro sobre as condições das calçadas. — Foto: Larissa Caetano/G1

O menino Miguel Barbosa, de 7 anos, preferiu tratar de reciclagem no livrinho. Com desenhos de montanhas de lixo, ele disse que a reutilização de resíduos é recorrente em casa.

Para Samuel de Souza, de 12 anos, o livro abriu portas para futuros projetos. Ele, que nunca escreveu antes, contou que pretende continuar a produção de histórias.
“Foi muito bom. Eu nunca fiz um livro, é a primeira vez que eu faço. Eu gosto de escrever história, é muito bom. Agora eu não quero parar, quero fazer outros livros”, disse o jovem.
As crianças e jovens cadeirantes fazem parte da ONG One By One, que leva os estudantes, uma vez por semana, para a escola Instituo Irajá, na Zona Norte, para ter aula com outras crianças.
Os livros foram lançados na última sexta-feira (6) em uma livraria no Shopping Nova América, em Del Castilho, na Zona Norte. Cerca de 200 pais, professores e amigos foram prestigiar os autores mirins na sessão de autógrafos.

Miguel Paulino, de 7 anos, escreveu um livro sobre reciclagem. — Foto: Larissa Caetano/G1
Miguel Paulino, de 7 anos, escreveu um livro sobre reciclagem. — Foto: Larissa Caetano/G1

Instrumento de transformação

Uma dessas crianças que recebem os novos colegas na escola é a Rafaela Medeiros, de 7 anos. Ela optou por escrever sobre a falta de empatia com amigos deficientes em sala de aula. A protagonista do livro, Cristal, sofreu bullying no colégio.
“Se a minha personagem, a Cristal, fosse da minha escola, e sofresse bullying, eu ia falar para ela ficar despreocupada porque existem mais pessoas boas do que pessoas ruins”, disse a menina.
A diretora do Instituto Irajá, Anna Paula Araújo, acredita que a produção dos livros funcionou como um instrumento de empatia com os jovens cadeirantes.
“O projeto do livro autoral deu a cada aluno a oportunidade de transformar um sentimento em uma história e, assim, poder compartilhá-lo, ampliando o seu alcance e seu poder de sensibilizar e mobilizar as pessoas. As temáticas de respeito às diferenças, inclusão e acessibilidade foram quase unanimidade entre todos os alunos participantes, mostrando que essa convivência despertou a empatia e a reflexão sobre nosso papel nas transformações que desejamos”, destacou Anna Paula.

*Estagiária, sob a supervisão de João Ricardo Gonçalves

Nenhum comentário:

Postar um comentário