Desde que a
“onda” do politicamente correto ganhou força e parte da sociedade se
conscientizou que somos TODOS iguais (ou, pelo menos, deveria ter se
conscientizado), vem sido propagada aos quatro ventos a importância e
necessidade vitais de vivermos em comunhão.
Mas, juntamente com o
politicamente correto, um outro termo surgiu e veio para ficar: o
PRECONCEITO! A partir do momento em que todos nós (ou quase todos,
infelizmente!) internalizamos este conceito, passamos a compreender
também que tudo aquilo que fosse de encontro a essa nova concepção, se
tornaria errado, constituindo preconceito.
Mas, afinal, o que quer dizer a palavra preconceito?
Vamos
à sua etimologia:A palavra preconceito é formada pelo prefixo latino
“pré” (anterioridade, antecedência) mais o substantivo “conceito”
(opinião, julgamento). Assim sendo, percebemos que o preconceito nada
mais é do que um conceito pré-estabelecido acerca de algo ou alguém.
Desde os primórdios da humanidade que o ser humano tem dificuldade em
conviver com as diferenças, pois tudo aquilo que é diferente, choca,
assusta e nos tira da chamada “zona de conforto”.
Mas onde quero
chegar com toda esta conversa acerca de preconceito? É bem provável que a
esta altura do texto você deve estar fazendo esta pergunta…
Dez
entre dez mães de pessoas com autismo, quando perguntadas sobre as
maiores dificuldades que enfrentam diariamente, mencionam o preconceito
em seus depoimentos.
Mais do que um simples fato, isto é uma
triste realidade! Realidade esta que os movimentos de pais e mães,
Brasil afora, têm lutado bravamente para mudar!
Entretanto, será
que nós, que sabemos o quanto o preconceito machuca e fere, pois
sentimos na pele e na alma os seus efeitos devastadores, somos
preconceituosos?
Vamos acompanhar as frases abaixo:
“Meu filho tem TEA, transtorno do espectro autista, o que é MUITO diferente de autismo.”
“Meu
filho tem autismo leve. Em razão disso, não gostaria que ele ficasse em
um grupo com crianças autistas mais comprometidas do que ele.”
Quantas vezes já escutamos estas falas em nosso cotidiano? Esta semana me peguei refletindo sobre isso…
São afirmações que surpreendem, principalmente por serem oriundas de mães de autistas.
A
primeira frase mostra a fuga do termo autismo, como se a família
tivesse “medo” desta nomenclatura. Transtorno Invasivo do
Desenvolvimento, Transtorno Global do Desenvolvimento e, mais
recentemente, Transtorno do Espectro Autista, são apenas algumas das
nomenclaturas utilizadas para designar a mesma síndrome que abrange 1%
da população pediátrica mundial, o autismo.
Penso que se nos
prendermos a rótulos estaremos perdendo um tempo valioso. Que
importância tem o nome da dificuldade que meu filho tem? Faz alguma
diferença que ele tenha TEA, TGD ou Autismo, por exemplo? As
dificuldades, porventura, deixarão de existir com este ou aquele nome?
Infelizmente, não.
As questões estarão ali, sem mudança alguma, independente do nome que tenham.
Na
segunda frase, a família demonstra preocupação pelo fato de seu filho,
com “autismo leve”, ter que interagir com crianças com um
comprometimento maior.
Interessante observar que esta,
provavelmente, é a mesma família que luta para que seu filho seja
incluído em uma escola regular, para conviver com crianças ditas
“normais”.
Se as mães de crianças neurotípicas pensarem assim, o
que será da inclusão? Não é justamente contra este tipo de pensamento
que lutamos?
Atualmente, muito se fala dos “diferentes tons de
azul”, expressão utilizada para denominar os diversos graus de
comprometimento que o autismo apresenta.
Embora o autismo possa
afetar cada indivíduo de forma única e diferenciada, penso que a dor que
uma família sente ao ter um filho com este diagnóstico independe do tom
de azul que seu filho tenha.
É óbvio e não cabe
nenhum questionamento que, quanto mais grave for o comprometimento de
uma pessoa autista, maiores serão os cuidados que ela inspira, assim
como os obstáculos a serem ultrapassados, fazendo com que as
dificuldades adquiram uma proporção muito maior.
O que não quer
dizer, de forma alguma, que uma família com um filho considerado autista
leve não sofra e não enfrente seus próprios percalços.
Em meu entendimento, é inconcebível julgar a dor alheia, assim como mensurá-la.
Não se pode e nem se deve comparar uma dor a outra. Dor não se julga!
Não
pode haver, entre nós, diferenças oriundas pela nomenclatura do
diagnóstico ou em razão do grau de comprometimento de nossos filhos.
Afinal, são todos autistas! Cada um a seu jeito, com suas próprias
limitações e habilidades.
E estes diferentes “tons de azul” não
são um impedimento para nos irmanarmos na mesma dor pungente de termos
nossas vidas modificadas pela síndrome de nossos filhos.
O autismo
afeta a todos nós e não escolhe raça, cor, idade, classe social,
profissão ou credo. Lutamos tanto contra o preconceito! Nossos filhos
são vítimas quase que diárias dele!
Não sejamos nós, pois, algozes uns dos outros.
Lembremo-nos que toda forma de preconceito é odiável e odiosa, venha de onde vier e de quem vier.
Denise Aragão
Fonte: http://www.mundoazul.org.br/